Imagine a cena, hoje. Freud em seu
gabinete tomando notas no tablet enquanto aguarda o próximo paciente.
De repente, uma criaturinha cabeçuda e esverdeada abre suavemente a janela da
sala e diz, em perfeito alemão: "- Com licença, Dr. Freud, podemos
conversar? Estou com um probleminha." Atônito, incrédulo, Freud titubeia, engasga,
mas resolve atender seu inusitado visitante, afinal, é uma oportunidade única
de aprendizado clínico.
- Sabe o que é 'seu' Freud, estou há tanto
temo por aí, fui fotografado, fiz selfie, dei rasantes em
aeroportos e bases militares, provoquei blackouts em
cidades inteiras, muitos programaram encontros comigo, fui perseguido por
aviões, deixei marcas no chão, cheguei até a sofrer um acidente...
- Hum
hum.
- Peguei um monte de gente para conhecer meu
planeta, algumas vezes à força, reconheço; dei voltas com elas em torno da
Terra, conversamos, fizemos amizade, dei souvenirs.
Uma de nossa gente até se envolveu com um brasileiro, mas acho que a coisa não
rolou, não pintou clima, sei lá...
- Hum
hum
- Doutor, já fizeram muitos filmes a meu
respeito, virei celebridade, escreveram centenas de livros, blogs, todo dia tem
congresso, seminário, palestra, seriados, programas, entrevistas e documentário
na TV. Muita gente ganha dinheiro em meu nome. Mando mensagens telepáticas,
psicografadas, espirituais, gravadas, viva voz, de tudo quanto é jeito. Dizem
que fizeram autópsia em um dos nossos, mas sacho meio estranha essa história.
- !
- Li outro dia que são milhares de
associações de pesquisa, centros, grupos privados e oficiais; artigos são
escritos, teses, dissertações, ensaios acadêmicos, mas esses aí falam que eu
não existo, que é coisa da cabeça das pessoas, que é tudo imaginação,
fantasia... um apadrinhado seu andou dizendo que eu sou assim uma espécie de
mito, coisa de arquétipo, inconsciente, não entendi direito...
- Eu sei de quem você está
falando...
- Então, como estava dizendo, depois de
tudo isso, muitos ainda não acreditam em mi, quer dizer, em nós. Não sei mais o
que fazer, sinto que estou passando por uma profunda crise existencial, 'seu'
Freud. Acho que estou à beira de um ataque de nervos. O que o senhor acha,
tenho cura?
- Deveras
interessante seu caso meu rapaz, sem dúvida, mas terei que consultar meus
colegas, trocar ideias, rever a literatura, sabe como é... volte daqui a alguns
anos-luz para uma nova sessão. Quem sabe eu possa te explicar.
Bem humorada na forma, esta breve ficção
traz um interessante ponto para discussão. Para que servem os grupos de
pesquisa, se o que dizem pesquisar não se deixa ser pesquisado? Outro dia um
amigo informou que seu grupo completou um quarto de século de existência.
Muitos outros igualmente comemoram suas efemérides. Sim e...? Que resultados
concretos trouxeram? Nenhum, nada, zero, traço, nem fumaça fizeram. Esse amigo
disse que seu grupo "estava sem atividade por falta de casuística
ufológica". Emblemático, não? Não
havendo disco voador na praça, pesquisar o quê? Nosso extraterrestre
no divã deve estar mesmo com uma tremenda dor de cabeça. Ninguém o vê mesmo om
todas aquelas peripécias.
É isso que
venho tentando mostrar todos esses anos. É isso que as pessoas, e os
ufólogos em particular, ainda não entenderam. O ufólogo não pesquisa o disco voador, ele apenas documenta quem alega ter
visto um. Da mesma forma, o pesquisador do paranormal também não investiga
o 'fantasma', mas o sujeito que diz tê-lo visto. Nenhum deles tem o objeto da
pesquisa porque tal objeto não existe! Por que é tão difícil entender
isso? A esmagadora maioria dos que participam dessas sociedades e centros de
pesquisa é formada por crédulos e entusiastas, que estão lá para colecionar
fotos de discos voadores como "prova definitiva" de sua existência.
Se não houver fotos, casos ou "contatos", não terão o que fazer! Suas
salas e ‘garagens’ ficarão às moscas. Não é incrível?
E não vamos esquecer aqueles que estão
convencidos de que os ETs não se mostram abertamente para "não causar
pânico na população", ou porque "uma revelação dessas acabaria com as
instituições religiosas" e coisas do tipo. Pela mesma razão, afirmam que
governos e Vaticano sabem, mas escondem toda a verdade sobre eles. Devo
informar que quem defende tal “teoria da conspiração” não faz a menor ideia do
que está dizendo, vivendo num mundo de ilusão e da mais fantasiosa ficção. São
eles que deveriam ir para o divã.
Agora, imagine se nos próximos anos a
casuística minguar de vez, se os discos voadores nunca mais retornarem ao
planeta, o que será desse pessoal? Sugestão: Que tal ler um pouco mais, estudar
um pouco mais, pensar um
pouco mais? Poucas coisas libertam tanto quanto o conhecimento, ele faz a
diferença entre a vida e a morte, entre a ação e a paralisia, entre a autonomia
e a servidão.
Já me perguntaram o que fazer para ser um
ufólogo. Difícil responder. Se eu indicar seguir o caminho que fiz, levará anos
para chegar aonde cheguei, e o que as pessoas querem é o prato pronto, tipo
leia isto ou faça aquilo e você será um ufólogo. Não é assim que funciona, não
há fórmulas nem regras, não é receita de bolo. Ler de tudo um pouco é
fundamental, mas não suficiente. No ritmo alucinante em que vivemos, paciência
e dedicação estão fora do mapa. Só funcionam se o objetivo é olímpico, e olhe
lá.
Vejo a Ufologia com os dias contados, em
franco declínio, ao menos essa que
aí está: canhestra, paleolítica, paralítica, falaciosa, idiotizante, com elevado
grau de demência. Exagero? Pois não é que um parlamentar siderado vindo sabe-se
lá de que planeta apresentou uma proposta para regulamentar a
"profissão" de ufólogo? É caso para psiquiatria. Sei que minhas
palavras não surtirão nenhum efeito e se perderão no vazio. Sei que muitos
darão de ombros e seguirão em frente, impassíveis. Sei, por fim, que nenhum
grupo fechará suas portas porque são eles que
precisam justificar sua existência, senão, quem notará que existem?
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