Obras

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sábado, 16 de abril de 2016


Sonhos com aliens são reais.
Achar que aliens são reais é sonho

O tema de hoje foi inspirado em mais um comentário de leitor. Não sei se ele tem conhecimento da filosofia hindu (eu não tenho), mas um extrato dessa literatura diz mais ou menos a mesma coisa: Os homens não têm os sonhos dos deuses, mas os deuses são os sonhos dos homens. Esse é um dos mais fascinantes mistérios da vida humana, que autor ou obra nenhuma é capaz de desvendar. Falo dos sonhos, não dos deuses. O sonho habita o oceano de profundezas abissais do inconsciente, e a luz, quando chega, só revela sombras indistinguíveis. Sonho nem Freud explica, mas bem que tentou,

"Esforçar-me-ei ainda por elucidar os processos a que se devem a estranheza e a obscuridade dos sonhos, e por deduzir desses processos a natureza das forças psíquicas por cuja ação concomitante ou mutuamente oposta os sonhos são gerados." Trecho do prefácio de A Interpretação dos Sonhos, onde já expressava sua preocupação com a complexidade do assunto.

Jung também se dedicou com muita intensidade e competência à dinâmica do inconsciente, mas quando indagado sobre sonhos, admitia que três décadas e meia de estudos não foram suficientes para lhe trazer uma compreensão plena do problema. Uma confissão significativa. Mesmo assim, não fugiu da raia. As filosofias orientais, o ocultismo, a mística e os discos voadores, entre outros, pontualmente estiveram no foco  de seu interesse psicanalítico.

Em Um Mito Moderno Sobre Coisas Vistas no Céu, Jung discorre sobre as experiências oníricas com discos voadores, ou Óvnis, como ele cautelosamente se referia: "Nos outros casos [sonhos], uma análise psicológica comparativa, mais ou menos profunda, leva à mesma conclusão. Para o leitor menos familiarizado com a psicologia do inconsciente, gostaria de observar que minhas conclusões não brotam de minha livre fantasia, como muitas vezes se supõe levianamente, mas estão fundamentadas sobre resultados de pesquisa da simbologia histórica." O itálico é ênfase meu. 

Depois, ele ressalta que "Este método [da amplificação] permite a conclusão - ao que me parece bastante segura - de que nos meus exemplos manifesta-se de forma unânime um arquétipo conhecido como central, que eu denominei o si-mesmo." O si-mesmo, a chave dourada que abre as pesadas portas desse castelo. Pensadores de intenso brilho iluminam o caminho: Paul Ricouer diz com todas as letras:  O si-mesmo como um outro. Arthur Rimbaud usa a gramática com sutileza:  Eu é um outro, e Fernando Pessoa abusa do lirismo: O universo é o sonho de si mesmo. Quem entendeu a mensagem sabe do que eles estão falando, e comprova porque 'profundezas abissais' não foi exagero.

De volta a Jung, 'Mito' e 'Coisas' podem parecer desimportantes, mas é inequívoco que, para ele, o 'disco voador' está muito além de sua suposta materialidade, e que os tentáculos da relação sonho/disco se estendem aos campos cultual, social, psicológico, histórico, simbólico e do imaginário. Não é pouca coisa, ao contrário, é muito mais do que parece ser. Foram esses os vetores fundantes da minha correção de rota no entendimento do fenômeno.

Assim, não tem problema algum sonhar com naves e alienígenas, anjos, ogros, vampiros, deuses, grilos falantes ou unicórnios. O problema é acreditar que sejam reais. Tem quem ache, ao sonhar com discos voadores e extraterrestres, que viveu uma experiência verdadeira. Sonhar com fogo não faz ninguém acordar chamuscado. Cuidado, um antigo ditado popular adverte que "Quando os deuses querem punir alguém, começam por lhe tirar o juízo".

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FREUD, S. A Interpretação dos Sonhos, v. 2. Imago. 1980.
JUNG, C. G. Um Mito Moderno Sobre Coisas Vistas no Céu. Vozes. 1991.
______. Psicologia do Inconsciente. Vozes. 1983.
______. Os Arquétipos e o Inconsciente Coletivo. Vozes. 2000.


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