Obras

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sexta-feira, 13 de julho de 2018




A HISTÓRIA TEM SEU PREÇO
Antes do texto anterior sobre o 'passado que é para sempre' ser publicado, alguém postou nas redes a seguinte mensagem: “Sinto saudade de alguns velhos amigos; talvez não seja saudade, seja necessidade de viver tudo outra vez”. Não foi simples coincidência ou lampejo premonitório, porque é um sentimento impregnado no espírito como se precisássemos refazer nossa história o tempo todo. Não é preciso diploma para identificar esse comportamento. Voltar ao passado para que, para corrigir os erros cometidos? Fazer diferente? Não é preferível fazer certo agora em vez de arrepender-se depois? É nessa linha que venho aprofundar aquela reflexão.

Há pouco mais de 50 anos, o mundo recebia com surpresa e admiração a notícia do primeiro transplante de coração humano. A iniciativa do médico sul-africano Christian Barnard abria possibilidades inimagináveis para a medicina. Uma vida humana estava em suas mãos, onde ética e responsabilidade sobressaiam acima de todas as coisas. Ele sabia dos riscos, sabia que ninguém antes havia ido tão longe, que não seria uma jornada fácil, com inúmeros percalços: rejeição do órgão, complicações cirúrgicas, mudanças no metabolismo, oscilações de pressão, enfim, poderia um fracasso histórico seria possível. Um gesto errado e tudo se perderia. Mas ele sabia também que tal passo só teria êxito se tivesse considerado todas as variáveis, se sua equipe contasse com os melhores profissionais, se os testes demonstrassem alto índice de sucesso e, claro, ele conhecia o ofício como ninguém e confiava em sua habilidade. Ele não era um aventureiro. O resto da história você conhece.

Há pouco mais de 60 anos, o mundo recebia com surpresa e assombro a notícia do primeiro homem lançado ao espaço, Yuri Gagarin. Um feito inédito que não era mais ficção, abrindo possibilidades inimagináveis para a astronáutica e até para o futuro da humanidade. Os cientistas tinham em suas mãos uma vida humana, onde ética e responsabilidade estavam acima de suas convicções e ambições. Eles sabiam dos riscos do seu arrojo, sabiam que ninguém antes havia tentado tal façanha, que não seria uma jornada fácil, com todas as dificuldades inerentes: problemas operacionais, erros de cálculo, falha humana, pane técnica. Nada poderia dar errado ou tudo cairia por terra, mas eles sabiam também que este pequeno passo só teria êxito se tivessem considerado todas as variáveis, se as equipes contassem com os melhores profissionais, se as simulações demonstrassem alto índice de êxito e, é claro, todos conheciam muito bem o ofício e confiavam em suas respectivas aptidões. Não eram aventureiros. O resto da história você também conhece.

Há pouco mais de 70 anos, o mundo recebia com surpresa e alvoroço a notícia de que discos voadores haviam sido observados pela primeira vez. Um fato sem precedentes que parecia saltar das páginas da ficção científica para o mundo real, abrindo possibilidades inimagináveis para o futuro das ciências. Os pesquisadores tinham em suas mãos uma vida não humana, onde ética e responsabilidade deveriam estar acima das convicções. Eles não sabiam dos riscos de sua empreitada, não sabiam que não seria uma tarefa fácil, com todos os impedimentos óbvios: ignorância absoluta da matéria, falta de critério, excesso de confiança nos métodos, falta deles, de leitura e literatura, necessidade imperativa de respostas e sobretudo desejo da confirmação de suas crenças. Um passo precipitado e tudo se perdeu. Eles não sabiam também que tal engajamento só poderia ser bem sucedido se tivessem considerado todas as variáveis - não o fizeram; se tivessem os melhores profissionais - não tinham; se as informações de cunho científico sobre vida extraterrestre demonstrassem alto percentual de probabilidade - demonstravam o contrário, e se todos soubessem o que deveria ser feito- ninguém sabia. Eram todos aventureiros. Você sabe no que deu.

Agora, imagine os dois primeiros eventos nas condições do terceiro: Se o cirurgião superestimasse sua competência e cometesse erros cruciais, se a equipe fosse inábil, o estudo incompleto, o instrumental inadequado, a técnica equivocada. O resultado seria desastroso. No segundo caso, se o foguete não tivesse força suficiente, se os motores falhassem, se o astronauta sofresse um colapso emocional, se o cálculo de reentrada na atmosfera estivesse errado, o resultado teria sido catastrófico. Quando acontecem falhas, a ciência revê suas teses, corrige procedimentos e técnicas, aperfeiçoa a tecnologia, revisa cálculos, desenvolve novos métodos, esgota todas as possibilidades. Hoje, o transplante é rotina em todo o mundo, a medicina não encontra limites, Lua e Marte se tornaram "íntimos", satélites navegam espaço afora e projetos mais arrojados estão nas pranchetas.

E a ufotopia, em que estágio se encontra? Aprendeu com seus erros? Não, porque nunca os admitiu. Buscou outras vias de pesquisa? Não, a única que tem lhe basta. Adotou conduta ético nas relações sociais? Não, ignora o que seja isso. Procurou dados técnicos e científicos atualizados e consolidados que justificassem seu exercício? Não, por julga sua atuação autossuficiente e impecável. Considerou uma autocrítica ou ajuste de rota? Se nunca teve rumo não tem o que corrigir. Admitiu o descompasso e o insucesso do discurso ou a possibilidade de um modelo alternativo de explicação? Impensável, é preferível soçobrar na insensatez a reparar a barca esfrangalhada. A extensão de sua ignorância é proporcional ao tamanho das bobagens que prega. Voltamos à equação discutida anteriormente: responsabilidade ou convicção, prazer ou realidade. Tudo está entrelaçado, como você já deve ter percebido.

O que distingue os primeiros dos últimos é que aqueles possuem espírito de grandeza, consciência do dever e responsabilidade nas ações. Têm sonhos, não delírios, ideais maduros, não crenças infantis, dúvidas, não certezas. Têm ética, pensam o futuro sem esquecer o passado. O resultado está no valor da colheita. A história tem seu preço e cobra caro pelos erros. Quem paga é o futuro presente. Lembre-se, teu passado é tua história sendo escrita o tempo todo, minuto a minuto, dia após dia! Já pensou nisso?

Um comentário:

  1. Mais uma vez um texto brilhante, irretocável, mesmo que o leitor tenha reservas quanto às considerações. O conteúdo cumpre um papel fundamental, o de instigar à reflexão, difícil missão nos dias de hoje, em que a maioria procura por leituras rápidas e, por isso mesmo, impossíveis de se manter além da superfície. O importante de sua obra, concordemos ou não com as afirmações, é a capacidade de revirar os redemoinhos do pensar, tão salutares à mente ávida por conhecimento. Sendo assim, muito obrigada por esse grande estímulo que é sua capacidade de nos balançar!

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