Obras

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segunda-feira, 29 de agosto de 2016


O Labirinto Humano - o "xis" da questão



Ao visitar meu irmão há quase um ano, em Portugal, num dado momento da esperada reunião familiar regada a muita pizza e vinho, o assunto girou em torno do meu posicionamento frente ao “disco voador”. A conversa atiçou a chama da curiosidade quando fui questionado por ter mudado radicalmente de opinião em tão pouco tempo. Explico: como ele não acompanhou minha trajetória de pesquisa ao longo dos anos, surpreendeu-se me ver contradizendo tudo aquilo em que acreditava antes. Esse "pouco tempo", na verdade, corresponde a pouco mais de 30 anos, desde quando ele mudou-se para aquele país. Esse hiato temporal ficou eclipsado no reencontro e o passado tornou-se um mero "ontem". 

A explicação dada naquela noite cabe agora àqueles que talvez também pensem da mesma forma, e quem sabe ainda possa servir de modelo de conduta aos mais novos. Longe de fazer uma autobiografia, vou apenas pontuar o que considero relevante para a questão.

A primeira década - 1971-80 - foi investida em leitura e aprendizado, assistir congressos e seminários, fazer amigos no meio e conversar com pesquisadores. Como todo jovem interessado, acreditava que os discos pudessem de fato existir porque tudo me levava a crer nisso. Na década seguinte, entrei de corpo e alma já como ufólogo atuante, passando a ver e viver de perto o ambiente e os bastidores da pesquisa ufológica. Estando dentro da coisa, imaginei que encontraria as respostas que procurava, mas me enganei. Foi quando percebi que “pesquisa” não se justificava nem no nome. Fui tomado por um desconfortável sentimento de decepção e frustração.

O que houve? Não havia, como nunca houve, método, rigor, isenção, autocrítica, reflexão, discernimento, disciplina, ponderação, conhecimento do objeto de estudo, e tal não poderia haver! O objeto do estudo não existe! Como pesquisar algo se não tenho esse algo para pesquisar? Como investigar aquilo de que não tenho a menor ideia do que é? Se esse algo só se entrou em cena porque alguém o viu manifestar-se, é evidente que esse alguém passe a ser o objeto primário da pesquisa! Para mim passou a ser a prioridade da pesquisa, e isso mudou todo o cenário de fundo.

Em grande medida, a inépcia e a imperícia dos ufólogos são de tal ordem que tipificam muito mais uma caricatura de pesquisa do que um procedimento cuidadoso conduzido por pessoas habilitadas. As exceções que realmente  pensam o fenômeno cabem num elevador. Além disso, entendi também que, desde o início, eu estava lá não para provar a existência dos objetos ou para confirmar minhas crenças, mas para conhecer, investigar e esclarecer os fatos à luz da razão e de um conhecimento de base científica. É claro que cometi erros porque aceitei as regras do jogo, mas logo que me dei conta dessa irreflexão coletiva, tirei meu barco desse rio, que se mostrava inavegável.

Quando me tornei articulista da revista Planeta naquele período (1980-90), usei o espaço para expressar minha justa preocupação, com matérias do tipo “Fraudes, misticóides, depoimentos imprecisos: obstáculos para um estudo mais preciso”¹; “Testemunhos ufológicos: o fator básico”²; em outra mídia,  contundência: “Um pouco mais de seriedade, por favor!"³, e assim por diante. Era o meu cartão de visita.

Martelando nessa tecla, percebi que estava pregando no deserto e angariando desafetos, porque meu discurso contrariava conveniências, vantagens e interesses alheios. Diante disso, e por me sentir andando em círculos, portanto, sem novos horizontes,  decidi sair do circuito para ir mais fundo na questão. Um vastíssimo campo se abriu. O turning point foi marcado com a publicação da Planeta Especial Ovnis4 no ocaso daquele período, escrita integralmente em parceria com Lúcio Manfredi. Foram 20 anos de gradual amadurecimento, pacientemente lapidado a custa de muita reflexão e genuíno desejo de saber. Era a transição entre um modelo fracassado de entender o fenômeno e a aposta segura em outra via de acesso a ele. Os desdobramentos e o resultado dessa mudança nos anos seguintes você saberá na próxima semana.




Planeta Ufologia 115-A, abril  1982.
Planeta Ufologia 143-B, dezembro  1984.
Realidade Fantástica, Agosto 1983.
Planeta Especial Ovnis, junho 1989.

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