Obras

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sexta-feira, 7 de setembro de 2018

SOLIDÃO QUE NOS HABITA
Final

Chegamos ao fim da série "Terra rara, vida rara", reprodução integral do capítulo homônimo da obra de Marcelo Gleiser, Criação Imperfeita,, mas não ficamos só nela. Muitos autores engrossam o coro, transformando a questão levantada por Brownlee e Ward em uma afirmação quase definitiva - estamos sós no universo em se tratando de vida extraterrestre complexa e/ou inteligente.

Nossa singularidade nos faz refletir cada vez mais em nossa responsabilidade, não apenas em relação ao nosso amadurecimento como também, e principalmente, ao outro - nosso espelho. Reitero e enfatizo o dito no post anterior para o qual - insisto - peço a sua atenção por se tratar do coração do problema: O desejo de companhia cósmica que nos tire desta solidão e silêncio angustiantes é o trauma original, o mito fundador da ufologia a partir do qual se construiu toda uma narrativa ficcional, e que, de modo conveniente, se consolidou como (falsa) verdade. Fazendo referência ao pai da Psicanálise, penso a ufologia como uma espécie de "interpretação dos sonhos" da humanidade. Por isso"ufotopia".

-o0o-

Em 1960, o radioastrônomo Frank Drake propôs uma fórmula para avaliar quantitativamente a probabilidade de existir vida inteligente na nossa galáxia. A equação ficou conhecida como Equação de Drake: uma simples multiplicação dos fatores essenciais para que vida inteligente existisse num sistema estelar. A vantagem da equação e suas várias versões (como a proposta no livro Sós no Universo?) é que nos ajuda a compreender os obstáculos para o surgimento de vida inteligente num planeta.



A desvantagem é que não sabemos como avaliar seus vários termos com precisão e nem mesmo quais deles incluir. Por exemplo, embora saibamos o número de estrelas na Via Láctea com boa precisão (entre 200 e 400 bilhões), não sabemos qual fração delas tem planetas na zona habitável, quais destes têm vida, a fração destes que tem vida complexa ou ainda quais destes abriga vida inteligente. Temos, também, que decidir quais fatores devem ser incluídos. Será que incluímos termos quantificando a fração de planetas com luas grandes, com movimento de placas tectônicas, com campos magnéticos capazes de proteger sua superfície da radiação cósmica? A escolha de quais termos devem participar da equação de Drake nos diz muito das intenções de quem os está incluindo. Na década de 1970, Carl Sagan, um entusiasta da busca por inteligência extraterrestre, estimou que existem em torno de um milhão de civilizações na galáxia capazes de se comunicar através do rádio. Outros afirmam que o número é um: nós.

O fato é que, mesmo que "eles" existam em algum canto do cosmo, muito possivelmente jamais saberemos. Até que tenhamos alguma forma de evidência conclusiva - e isso pode demorar muito, muito tempo - na prática estamos sós na vastidão cósmica. Entender isso, e o que nos diz sobre quem somos e qual a nossa missão, deveria ser suficiente para mudar o rumo da nossa história, redefinindo o nosso futuro e o do nosso planeta.


...Fim...

Gleiser resume classificando o surgimento da vida em 4 etapas: Do Big Bang às primeiras estrelas, destas aos planetas, dos planetas à vida e da vida complexa à inteligente. Tudo no espaço de bilhões de anos! Considerando que a Terra é o único planeta conhecido com vida e compreendendo as condições que favorecem a sua existência, os cientistas fizeram uma extrapolação desses factores para outros corpos planetários. As características que fazem de um planeta um sistema com vida são:

 Órbita circular, com distância constante relativamente à sua estrela;
 Existência de uma porção mínima de elementos metálicos, mais pesados que o hidrogênio ou hélio, pois é neles que se baseia a vida (carbono, azoto e oxigênio);
 Abundância de elementos percursores de moléculas orgânicas - hidrogênio, hélio, oxigênio, carbono, nitrogênio;
 Abundância de água, que é um bom solvente, estável num determinado intervalo de temperaturas e importante para a formação de atmosfera;
 Abundância de hidrogênio. A sua perda e sua posterior união a outros elementos levarão à criação de uma atmosfera redutora, permitindo o aparecimento de vida;
 Existência de um substrato rochoso, que permita a fixação de organismos.


É evidente que um único capítulo de um único livro não esgotaria a complexidade da vida. Ela não é uma coisa, não é mensurável, não cabe em palavras. A vida não é só um aglomerado de moléculas e elementos químicos que resolveram se reunir para povoar o planeta. Pensando nisso, para enriquecer um pouco mais a conversa, e, como no título do post anterior, estabelecer as fronteiras do imaginário, trago mais algumas considerações da obra "Sós no Universo?" 


Só a Astrobiologia seria suficiente para por um fim a essa paranoia desenfreada de visitantes alienígenas, mas é aí que entra o arranjo transdisciplinar com argumentação sólida e muito bem estruturada, fonte do embasamento deste blog. Sim, o problema é poliédrico, com várias faces e ângulos a serem considerados, mas a questão central não muda: Existe alguma prova a favor da tese de vida abundante no universo? Nenhuma!

Brownlee responde
Não podemos "provar” que a vida animal seja rara no Universo. Prova é algo raro em ciência. Nossos argumentos são post hoc, no seguinte sentido: Examinamos a história terrestre e procuramos chegar a generalizações a partir daquilo que vimos aqui. Nós manifestamos uma posição muito pouco adotada, mas cada vez mais aceita por muitos astrobiólogos. Formulamos uma hipótese zero face às ruidosas afirmações, quer por parte de muitos cientistas como pela mídia, de que a vida - quer de alta ou baixa inteligência - está por aí, ou mesmo que animais simples como vermes sejam frequentes por toda parte. Talvez, apesar das incontáveis estrelas, nós sejamos os únicos animais ou, pelo menos, estamos entre os poucos escolhidos.
Alguns conceitos filosóficos são discutidos na obra como a 'centralidade da Terra' e, por consequência, a do homem; depois a 'descentralidade' de ambos, sugerindo uma correlação com a qual os autores não concordam:
Se for correta, entretanto, a hipótese de "Sós no Universo?", reverteremos essa tendência de descentralização. O que dizer se a Terra, com sua carga de animais adiantados, for virtualmente única neste quadrante da galáxia - o planeta mais diverso num perímetro, digamos, de 10.000 anos-luz? O que dizer se ela for extremamente única - o único planeta com vida animal nesta galáxia e até no Universo visível, um bastião de animais num mar de mundos infestados de micróbios?
No início da obra os autores admitem a possibilidade de existir vida em outros planetas, mas vida de micróbios, capazes de enfrentar condições extremamente adversas como as que existem em lugares altamente inóspitos na Terra. Estas formas de vida nas galáxias, segundo eles poderiam ser muito frequentes, mas em relação à vida superior, a ideia é excluí-la.


Aqui retomo a palavra finalizando o post. Toda a discussão trazida nesta série é apenas o recorte de um processo bem mais profundo e intrincado. Os fatores que estabelecem a habitabilidade de um planeta são múltiplos e emaranhados: Não houvesse a Lua, não haveria vida; se o Sol fosse "um pouco" mais quente ou frio, não haveria vida; se a Terra estivesse "um pouco" mais ou menos distante dele, não haveria vida. A busca por "companhia" é instintivo e pulsional tanto no plano do cotidiano terreno quanto no âmbito cósmico, desde os primeiros núcleos tribais cruzando extensas áreas desconhecidas sem a menor ideia se iriam encontrar outras tribos. Depois vieram as grandes navegações, novos mundos, outras civilizações e culturas, o mundo sendo esquadrinhado. Percorridas todas as terras e todos os mares, restou o espaço.


Sem os instrumentos para ir além, o homem desenvolveu a imaginação, criou histórias, fabulou aventuras, inventou máquinas, viajou por mundos fantásticos sem abandonar o desejo de explorar o inexplorado, desbravar o desconhecido. E esse dia chegou. De um pequeno passo o salto gigantesco - a Lua -, e não parou mais. Não há limites, o infinito é o horizonte que o faz seguir adiante. Isso é ciência, é buscar o conhecimento através do potencial intelectivo. O resto são crenças vãs e delírios.

Acho que já passou da hora de se aceitar e acostumar, de uma vez por todas, com a realidade de sermos a única espécie inteligente nesse imenso e majestoso universo. Mesmo que na mais remota possibilidade existam outras espécies, jamais serão como nós. É seu direito continuar acreditando em discos voadores, seres alienígenas e toda uma infindável gamade representações mágicas, mas saiba que estará vivendo na mais absoluta ilusão, própria de mentes imaturas e fantasiosas.

3 comentários:

  1. Eu, que sequer creio no homem indo à lua (pelo menos não naquele momento anunciado), ainda acredito nas possibilidades do espaço.

    Talvez eu precise acreditar, por perceber o quão pequenos e insignificantes somos nós seres humanos, limitados intelectos em frágeis invólucros.

    Quero crer que o homem, tal qual é, não seja a única espécie inteligente. Seria um desastre. Desastre este com dias contados, pois não demora muito e este será um planeta perdido, à beira do inabitável graças à nossa falta de inteligência.

    Sem dúvida, um assunto muito complexo, cuja discussão não está ainda ao meu alcance. De todo modo, é bom sacudir o pensamento, antes que teias se formem...

    Grata pela reflexão!

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