Obras

Obras

quinta-feira, 7 de novembro de 2019


VOCÊ ESCOLHE O CAMINHO NÃO O DESTINO
À sua estultícia o homem chama destino.
Homero (928 a.C.)


Quando um leitor faz comentários sobre o post, fico inclinado a responder através de um novo texto, o que é uma vantagem, já que todos podem acompanhar a conversa, ao mesmo tempo que me estendo um pouco mais do que faria numa réplica direta. Penso ter havido um erro de entendimento na questão trazida pelo leitor referente ao texto Ficar ou Fazer, ou talvez eu não tenha sido suficientemente claro. O assunto foge ao habitual, mas é uma reflexão interessante. Vou dividir o comentário:
Será essa trajetória o que se chama destino? Sua trajetória o impele a compartilhar suas luzes, mas também o impede, já que suas conclusões são apenas suas,
Primeiro ponto: trajeto é caminho, e trajetória é caminhada, e essa minha caminhada sem descanso me permite compartilhar as luzes. Destino é o ponto final de qualquer caminhada, e, no caso da vida, esse destino só pode ser a morte. Por exemplo, é totalmente errado dizer fulano estava destinado a ser médico” ou ele escolheu seu destino”. Você escolhe o caminho e projeta o futuro, mas não há nenhuma garantia de que o alcançará, ou seja, não necessariamente resultará no objetivo previsto. Segundo ponto: Posso e devo dividir minhas reflexões e/ou conclusões para que o leitor faça uso delas se lhe convier. Não fosse assim, de que adiantaria Nietzsche, Kant ou qualquer outro legar uma obra se suas reflexões/conclusões não forem tornadas públicas? É óbvio que não estou me comparando a nenhum deles, mas o ato de passar adiante minha experiência é legítimo. Também não se trata de missão”, termo  usado por alguns como sinônimo de destino. Longe disso. Continuando:
Se há destino, quem ou o que nos destinou? Estou cada dia mais inclinado a aceitar que nascemos programados; escolhemos certos rumos, mas não todos. Parece claro que ninguém é dono da própria vida.
Esse  trecho já foi parcialmente respondido, mas cabe acrescentar algo mais. Nada nem ninguém nos destinou e não há qualquer possibilidade de programação prévia. Achar que um ente programa nossa vida e nosso destino é, de novo, uma ideia escapista, covarde e infantil de transferir uma responsabilidade que é só nossa para esse ente imaginário. Aliás, curioso e oportuno, o próximo  post já pronto trata exatamente dessa questão: a natureza humana. Reitero que temos total liberdade para escolher nossos caminhos e é a partir dessas escolhas que o futuro pode ser projetado. Contudo, há um problema para esse projeto dar certo.

Estou falando de Virtù e Fortuna nos termos propostos por Machiavelli: virtù - a capacidade de conduzir a vida a partir de suas potencialidades e com os meios certos para êxito dos objetivos desejados, e fortuna - situações que não são do seu controle e que influenciam o rumo da vida, para o bem ou para o mal. Acho que não preciso dar exemplos. Neste caso, a virtude consiste em ser resiliente, adaptar-se ou contornar as circunstâncias, as contingências, a fortuna. O senso comum, na falta de outro termo e por ignorância mesmo, chama isso de sorte ou azar, um erro crasso apesar de consagrado. É fácil dizer que “ele estava predestinado a ser presidente depois do fato consumado. Há, por trás da palavra destino, um desejo e uma necessidade inconsciente de que um ente transcendente vele por nós indicando o caminho, daí a sempre grande procura pelas artes divinatórias como astrologia e cartomancia, entre outras, a nos predizer o futuro/destino.

Quanto a última frase do comentário, o leitor está errado, É evidente que somos donos de nossa vida, responsáveis por nossos atos, simplesmente porque podemos direcionar o que vamos fazer dela, ou seríamos animais estúpidos vivendo do jeito que todo animal vive, sem poder de escolha e sem consciência de si, à mercê inteiramente das contingências e daquilo que a sua natureza determina que ele seja. O animal não é feliz ou infeliz, ele apenas é, ele já nasce com a sua vida pronta e não fará nada diferente daquilo que deverá fazer. Você, ao contrário, conforme a virtù e a fortuna, sua vida seguirá a trajetória que escolher, pode ser e fazer o que quiser, pode ficar na janela ou fazer acontecer (quem fica não faz, quem faz ensina), pode ser professor ou paraquedista, pode morar em Paris ou na Patagônia. Liberdade é responsabilidade.

3 comentários:

  1. O desfecho do texto me levou imediatamente a uma máxima do Sartre, que diz que estamos condenados a ser livres.
    O restante, também amei, embora discorde de alguns pontos, como o de ser destinado a algo. Acredito que nossa própria gênese humana já seja uma forma de destino, não acha? Enquanto outros seres têm naturezas tão diversas, a gente está à mercê das "tecnologias" e potencialidades da nossa condição, que foi materializada sem nosso consentimento. Por outro lado, com relação às escolhas, aí sim, temos maior liberdades de optar por isso ou aquilo, apesar de o brasileiro ter muitas restrições de escolha, devido a condições precárias em que sua maioria vive. No mais, parabéns como sempre!

    ResponderExcluir
  2. Sim, senhor Reis! Grato por ter dedicado um post inteiro ao meu questionamento. Concordo com 80% do texto e sabia que o teor não poderia ser diferente. Porém, ainda não "cheguei lá" (em especial) quanto aos dons, tendências, pendores, potenciais e vocações que algumas pessoas demonstram em terna idade.
    Abraço.

    ResponderExcluir